terça-feira, 11 de novembro de 2014

Contra crise, Venezuela abre setor petrolífero

Acordos dão mais controle a parceiros estrangeiros

Por WILLIAM NEUMAN
MENE GRANDE, Venezuela - Em uma colina da qual se avista esta cidade abafada, em um pequeno poço pintado de amarelo, azul e vermelho, as cores nacionais, uma bomba se movimenta para cima e para baixo.
Aqui, o petróleo bruto flui pelos dutos do mesmo modo como acontecia há cem anos, quando este se tornou o primeiro poço bem-sucedido do país, abrindo caminho para que a Venezuela, então um sonolento grotão de cafeicultores e pecuaristas, se tornasse um dos países mais ricos em petróleo.
Hoje, a pouca distância deste histórico poço petrolífero chamado Zumaque 1, as ruas permanecem sem asfalto, e as pessoas vivem em casebres feitos com chapas de metal ondulado. Mesmo após mais de um século de petróleo sendo bombeado, o produto ainda está tão próximo da superfície que chega a jorrar do chão nesta cidade, numa negra e pegajosa lembrança da riqueza em meio à pobreza.
"Olhe para as riquezas da Venezuela", disse o operário Ramón Materán, 64, apontando para o petróleo bruto que escorre e se espalha pelo chão do seu bairro, chamado Baralt 1. Então, olhando ao redor para as ruas esburacadas e os barracos sem saneamento, ele disse: "Apesar de todas as riquezas da Venezuela, as coisas estão bastante abandonadas aqui".
A economia da Venezuela enfrenta dificuldades, e o mesmo ocorre com seu monopólio petrolífero administrado pelo governo, a Petróleos de Venezuela, ou PDVSA. A empresa precisou recorrer ao Banco Central para obter milhões de dólares em empréstimos. Já cogitou vender sua subsidiária americana, a rede de postos Citgo, e estuda elevar o preço da gasolina na Venezuela, que tem o combustível mais barato do mundo.
Essas mudanças vêm sendo feitas sem estardalhaço, gerando suspeitas de que o presidente Nicolás Maduro, no cargo há menos de um ano e meio, teria receio de que seus partidários as vejam como uma traição às medidas de expropriação dos interesses petrolíferos estrangeiros adotadas pelo presidente Hugo Chávez, morto em 2013.
Na esperança de aumentar o investimento e dar um salto na estagnada produção, a PDVSA assinou ou está negociando acordos financeiros com numerosas companhias petrolíferas estrangeiras que operam aqui. Esses acordos dão às empresas maior poder sobre as operações de extração e a compra de materiais e equipamentos, bem como maior controle sobre gastos e lucros, de acordo com pessoas familiarizadas com eles.
Estrangeiros não precisam mais agir por intermédio de subsidiárias controladas pela PDVSA, fonte frequente de atrasos e corrupção.
"Se a PDVSA de antigamente tivesse assinado algo assim, os chavistas a teriam acusado de traição", disse Francisco Monaldi, professor de política energética da Escola de Governo Kennedy, da Universidade Harvard.
"Esses contratos são assinados por necessidade", disse Carlos Bellorin, analista sênior da consultoria IHS Energy, de Londres. "Eles não têm fluxo de caixa suficiente para investir na exploração e produção ou para elevar a produção dos projetos existentes."
Embora as empresas petrolíferas continuem como parceiras minoritárias da PDVSA, os novos acordos lhes conferem um poder muito maior do que nos últimos anos quanto ao gerenciamento dos campos petrolíferos da Venezuela. O país tem as maiores reservas estimadas do mundo, e o petróleo representa mais de 95% da sua renda com exportações.
Mene Grande, com uma população de cerca de 21 mil pessoas, é onde teve início a era petrolífera no país. Em 1914, o Zumaque 1 -nome em espanhol da árvore sumagre, que crescia nos arredores- se tornou o primeiro poço bem-sucedido do país. Roberto Morón, 40, sócio em uma loja de material de construção, disse que Mene Grande deveria ter recebido mais do petróleo extraído de seu solo.
"As coisas aqui deveriam estar bem melhores", afirmou. "Há muitos poços aqui. Mene Grande dá, dá e não recebe nada em troca."NYT, 11.11.2014.

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